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quinta-feira, 31 de maio de 2007

O (mito do) menino prateado

Muita gente tenta responsabilizar os outros por suas irresponsabilidades. Eu sou um desses. Por isso, enquanto caminhava apressado para chegar à faculdade, maquinava motivos capazes de convencer a mim e ao mundo que o livro guardado em minha bolsa só não estava lido (ainda!) devido à demora de meus vários amigos que o possuíam em me emprestar um exemplar.
Atirando a mais remota possibilidade de perfeição para longe, principalmente por estar mancomunado com sua maior inimiga, acelerei um pouco mais o passo. Até que, mesmo estando tão envolto em aflições ordinárias, consegui discernir no meio da impessoalidade brutal do concreto armado que nos estrutura um bom motivo para diminuir a marcha: logo à minha frente completavam-se, disputando a atenção dos passantes, duas realidades incrivelmente distintas. Antagônicas, mas afins: exemplar "puro" do paradoxo urbano.
Como acredito que tenha deixado claro, tinha pressa. Por isso, ao avistar a bela moça que segurava na altura do peito um impresso, para mim, familiar, tive de retribuir seu sorriso - já amarelado pela receptividade duvidosa do público - e continuar correndo de encontro ao inspirador do título desta análise: o menino prateado.
O curto espaço que os separava foi suficiente para que eu fosse refrescando memória e conceitos. Decifrei, no minúsculo contato que tive com a bela moça, os desejos e sonhos que esta guardava na organização peculiar das letras de seu jornal. Já havia conversado com ela. Não por mérito de minhas fracas forças atrativas, mas pela paciência, o tempo de sobra e o "um real" que dispus a trocar por seu impresso, além da fala pausada e clara que empregava na tentativa de cativar um passante distraído como eu e fazê-lo entender os milagres culturais e sociais possíveis no mundo sem classes. Para ela e os seus, toda a riqueza gerada pelo fanatismo capitalista, ao qual o mundo encontra-se entregue, sendo enfim distribuída adequadamente entre todas as partes envolvidas em sua produção nos revolucionaria... Meus sonhos acompanharam os dela, até a realidade impor a lembrança do compromisso: aula! Me despedi prometendo ler e pensar melhor sobre o assunto...
Na mesma reticência estava - imediatamente após o rápido rememorar - quando dei de cara com o pequenino: um menino que tentava com todas as forças domar a inquietude da infância para fingir-se de estátua, envolto num banho de prata falsa e, provavelmente, barata. Me assustei com a cena e estranhei a reverência exagerada que o pequenino totem – mero monumento à desigualdade da sociedade moderna que era - dedicava às não poucas pessoas que corriam para despejar os mesmos "um real" (que minha amiga comunista pedia pela síntese de seu conhecimento acadêmico e sua fé sincera) no vasilhame disposto em sua frente, especificamente para isso.
Ironia fina!

Talvez infelizmente, a sociedade não tem tempo de ouvir que a doutrina comunista prega que todos os meninos prateados sejam de ouro e estejam na escola, por exemplo. O fato é que as afinidades parecem se dar por espasmos. Mais valeu o moleque, naquele caso, do que a erudição e sua salvação letrada!
As coisas do mundo parecem sempre estar encardidas demais para podermos encontrar uma fresta de clareza na turva janela que nos separa da realidade. Alguns preferem ficar daqui observando as sombras, outros se trancam no porão (uma caverna?!) para tentar interpretar a essência das imagens com o que lêem nos livros... É preciso ser um meio termo disso! E estar apto a conversar com as belas comunistas e os meninos prateados como se fossem nossos irmãos, já que disso não passam!
Deve ser por isso que nossos amigos comunistas gastavam saliva para tentar levar os "um real" que deram para o garoto: não falavam com ele... Os mundos são tão distintos que tornaram-se incomunicáveis... Na verdade estão todos falando sobre a mesma coisa em suas respectivas línguas... Todos querem ser felizes, reconhecidos, compreendidos... Como eu! Como você que leu até aqui... Como os comunistas e os meninos prateados...


Quem será que está enganado?

O povo, por não se interessar sobre a dominação que lhe é imposta?
Os grupos que tentam conscientizar o povo com seus dialetos acadêmicos?
Os meninos prateados, por não irem à escola e contribuírem diretamente com a manutenção do sistema?!

Ou será que tá tudo errado?!

Braz

2 comentários:

Anônimo disse...

Lindo!

Anônimo disse...

Forma sem função. Comunismo? Qual? O que mata na China? O que matou no URSS? O que mata em Cuba? O academicismo comunista que produz tantos meninos prateados quanto a oca-Cola? O dos menininhos ricos que vão à UFF brincar de comunismo e dar mais uma esmolinha a um companheiro pobrinho? Literariamente fraco este texto... e, na prática, tão sem função como tantos outros que fazem do discurso contra a dominação um enorme reforço para a dominação.